«Se podes olhar, vê. Se podes ver, repara.» Livro dos Conselhos, El-Rei D. Duarte
31.12.12
Paulo Rocha [1935-2012]
«Verdes Anos»
Poema: Pedro Tamen
Música: Carlos Paredes
Voz: Teresa Paula Brito (a cantora da banda sonora do Filme)
(colhido em samartime)
24.12.12
19.12.12
17.12.12
12.12.12
A EUROPA
A Europa da morte.
A Europa sem Deus.
São colónias da Alemanha
Portugal
e restantes países europeus.
Hitler perdeu a guerra, mas os seus
filhos e netos já cantam vitória
à custa da Usura.
António Barahona
Telhados de Vidro, N.º 17 . Novembro . 2012
A Europa sem Deus.
São colónias da Alemanha
Portugal
e restantes países europeus.
Hitler perdeu a guerra, mas os seus
filhos e netos já cantam vitória
à custa da Usura.
António Barahona
Telhados de Vidro, N.º 17 . Novembro . 2012
9.12.12
5.12.12
Papiniano Carlos [1918-2012]
UM GALO CANTA
Um galo canta
na manhã futura.
Seu canto espanta
a noite escura.
Abre-se, floresce
como um clarim.
Ou será que amanhece
dentro de mim?
Aqui, onde
tudo acaba e principia:
sol que nunca se esconde,
noite que sempre foi dia.
Papiniano Carlos
SONHAR A TERRA LIVRE E INSUBMISSA..., Editorial Inova, SARL, Porto, 1973
Um galo canta
na manhã futura.
Seu canto espanta
a noite escura.
Abre-se, floresce
como um clarim.
Ou será que amanhece
dentro de mim?
Aqui, onde
tudo acaba e principia:
sol que nunca se esconde,
noite que sempre foi dia.
Papiniano Carlos
SONHAR A TERRA LIVRE E INSUBMISSA..., Editorial Inova, SARL, Porto, 1973
2.12.12
A PERDA
A perda real é a perda do sentido
Só se perde o sentido do que não
foi nunca real senão quando perdido
Gastão Cruz
ESCARPAS, Assírio & Alvim, Lisboa, Fevereiro 2010
Só se perde o sentido do que não
foi nunca real senão quando perdido
Gastão Cruz
ESCARPAS, Assírio & Alvim, Lisboa, Fevereiro 2010
1.12.12
Um abismo
Um abismo de silêncio
abriu-se na casa.
Funâmbulo
entre dois tempos:
o passado, lenitivo
o futuro, ameaçador.
Pelas ruas, tal um verme,
rasteja o presente.
Jorge Gomes Miranda
REQUIEM, Assírio & Alvim, Lisboa, Novembro 2005
abriu-se na casa.
Funâmbulo
entre dois tempos:
o passado, lenitivo
o futuro, ameaçador.
Pelas ruas, tal um verme,
rasteja o presente.
Jorge Gomes Miranda
REQUIEM, Assírio & Alvim, Lisboa, Novembro 2005
24.11.12
ESPANTA-ESPÍRITOS
Amanhã tudo será pior
ainda, eu sei: o hábito, a inércia,
o sem remédio da vida - tão pouco
haverá a salvar.
Por toda a cidade os desconhecidos
subirão outro degrau para o escuro
da noite, e a memória será talvez
um remorso:
aquela manhã de sol
na varanda, o espanta-espíritos
com peixes de alumínio num rosário
de contas profanas.
Ainda o tens? Ainda canta,
de madrugada, se o vento sopra
do mar?
Não importa. Foi sempre de menos
o muito que pedimos
e a parte que tivemos.
Rui Pires Cabral
CAPITAIS DA SOLIDÃO, Edição Teatro de Vila Real, Outubro, 2006
ainda, eu sei: o hábito, a inércia,
o sem remédio da vida - tão pouco
haverá a salvar.
Por toda a cidade os desconhecidos
subirão outro degrau para o escuro
da noite, e a memória será talvez
um remorso:
aquela manhã de sol
na varanda, o espanta-espíritos
com peixes de alumínio num rosário
de contas profanas.
Ainda o tens? Ainda canta,
de madrugada, se o vento sopra
do mar?
Não importa. Foi sempre de menos
o muito que pedimos
e a parte que tivemos.
Rui Pires Cabral
CAPITAIS DA SOLIDÃO, Edição Teatro de Vila Real, Outubro, 2006
19.11.12
Mil Novecentos e Noventa e Um
Velhas coisas são as que guardamos
no sótão
e não queremos devolver à procedência,
uma vara de garrafas vazias,
revistas esfarrapadas,
cartões de visita,
um par de sapatos de verniz,
quase novos,
a que se junta
uma carteira gasta,
de senhora,
um manequim sem cabeça,
uma panela furada,
o berbequim.
Pena é que os furos possíveis
não caibam já no cinto,
e a dentadura
não nos caiba na boca.
Presa a língua à trave que suporta o telhado
e as palavras disponíveis
para abate,
teríamos, por fim,
acantonado o silêncio,
o desusado silêncio
do sótão imperturbado.
Amadeu Baptista
açougue, &etc, Lisboa, Junho de 2012
no sótão
e não queremos devolver à procedência,
uma vara de garrafas vazias,
revistas esfarrapadas,
cartões de visita,
um par de sapatos de verniz,
quase novos,
a que se junta
uma carteira gasta,
de senhora,
um manequim sem cabeça,
uma panela furada,
o berbequim.
Pena é que os furos possíveis
não caibam já no cinto,
e a dentadura
não nos caiba na boca.
Presa a língua à trave que suporta o telhado
e as palavras disponíveis
para abate,
teríamos, por fim,
acantonado o silêncio,
o desusado silêncio
do sótão imperturbado.
Amadeu Baptista
açougue, &etc, Lisboa, Junho de 2012
18.11.12
MATEUS, 26, 26
Tomai, este é o meu corpo:
formas e símbolos.
Fora de mim, o meu reino
desmembra-se dentro de mim.
E o que fala falta-me
dentro do coração.
E estou sozinho fora de mim
como um coração fora de mim.
Manuel António Pina
POESIA REUNIDA (1974-2001), Assírio & Alvim, Lisboa, Novembro 2001
formas e símbolos.
Fora de mim, o meu reino
desmembra-se dentro de mim.
E o que fala falta-me
dentro do coração.
E estou sozinho fora de mim
como um coração fora de mim.
Manuel António Pina
POESIA REUNIDA (1974-2001), Assírio & Alvim, Lisboa, Novembro 2001
16.11.12
Os inquiridores
Está o mundo coberto de piolhos:
Não há palmo de terra onde não suguem,
Não há segredo de alma que não espreitem
Nem sonho que não mordam e pervertam.
Nos seus lombos peludos se divertem
Todas as cores que, neles, são ameaças:
Há-os castanhos, verdes, amarelos,
Há-os negros, vermelhos e cinzentos.
E todos se encarniçam, comem todos,
Concertados, vorazes, no seu tento
De deixar, como restos de banquete,
No deserto da terra ossos esburgados.
José Saramago
Os Poemas Possíveis, Editorial Caminho, Outubro de 1998
Não há palmo de terra onde não suguem,
Não há segredo de alma que não espreitem
Nem sonho que não mordam e pervertam.
Nos seus lombos peludos se divertem
Todas as cores que, neles, são ameaças:
Há-os castanhos, verdes, amarelos,
Há-os negros, vermelhos e cinzentos.
E todos se encarniçam, comem todos,
Concertados, vorazes, no seu tento
De deixar, como restos de banquete,
No deserto da terra ossos esburgados.
José Saramago
Os Poemas Possíveis, Editorial Caminho, Outubro de 1998
15.11.12
[O valor das coisas]
O valor das coisas
não está tanto nelas
como no valor que lhes atribuímos
Daí a nossa incerteza
mas também a margem
da nossa liberdade
António Ramos Rosa
Em torno do imponderável, Editora Licorne, Lisboa, Outubro de MMXII
não está tanto nelas
como no valor que lhes atribuímos
Daí a nossa incerteza
mas também a margem
da nossa liberdade
António Ramos Rosa
Em torno do imponderável, Editora Licorne, Lisboa, Outubro de MMXII
13.11.12
11.11.12
[O poeta carreirista]
O poeta carreirista
está sempre a morrer nos poemas
de cancro do pulmão ou cirrose hepática
mas na verdade cuida da sua obra (e do respectivo autor)
data-a e arquiva-a minuciosamente
trava mesmo amizade com uma bibliotecária
que o auxilia em bräille
não vá acontecer-lhe
como a Camilo
frequenta o ginásio,
masca Trident Senses
e milita nos partidos certos.
O poeta carreirista já nasceu poeta
foi bem orientado desde pequeno
inscrevendo-se na Associação Portuguesa de Autores
mesmo sem obra publicada
não fosse alguém roubar-lhe a ideia
dorme com um olho aberto outro fechado
- nos poemas lê-se insónia -
e namora rapariga letrada
embora aos 35 sofra uma crise de orientação sexual
e aos 40 tente uma escrita erótica mais abrangente
a manquejar Sena e a farejar alguns espanhóis.
O poeta carreirista não bebe cerveja
mas vinho tinto do Alentejo
abre às vezes excepções e acompanha-a com
tremoços e caracóis.
O poeta carreirista vai a tudo
rádio, TV e revistas,
coquetterie fina
e instala-se, de preferência, na capital.
Ana Paula Inácio
2010-2011, Averno, Junho de 2011
está sempre a morrer nos poemas
de cancro do pulmão ou cirrose hepática
mas na verdade cuida da sua obra (e do respectivo autor)
data-a e arquiva-a minuciosamente
trava mesmo amizade com uma bibliotecária
que o auxilia em bräille
não vá acontecer-lhe
como a Camilo
frequenta o ginásio,
masca Trident Senses
e milita nos partidos certos.
O poeta carreirista já nasceu poeta
foi bem orientado desde pequeno
inscrevendo-se na Associação Portuguesa de Autores
mesmo sem obra publicada
não fosse alguém roubar-lhe a ideia
dorme com um olho aberto outro fechado
- nos poemas lê-se insónia -
e namora rapariga letrada
embora aos 35 sofra uma crise de orientação sexual
e aos 40 tente uma escrita erótica mais abrangente
a manquejar Sena e a farejar alguns espanhóis.
O poeta carreirista não bebe cerveja
mas vinho tinto do Alentejo
abre às vezes excepções e acompanha-a com
tremoços e caracóis.
O poeta carreirista vai a tudo
rádio, TV e revistas,
coquetterie fina
e instala-se, de preferência, na capital.
Ana Paula Inácio
2010-2011, Averno, Junho de 2011
4.11.12
[Porque o poema é sempre contra o vómito]
Porque o poema é sempre contra o vómito.
Porque o poema é sempre, SOBRETUDO,
contra engolir o vómito.
Vasco Gato
Omertà, Quasi Edições, Março 2007
Porque o poema é sempre, SOBRETUDO,
contra engolir o vómito.
Vasco Gato
Omertà, Quasi Edições, Março 2007
31.10.12
Carlos Drummond de Andrade
OBRIGADO
Aos que me dão lugar no bonde
e que conheço não sei donde,
aos que me dizem terno adeus,
sem que lhes saiba os nomes seus,
aos que me chamam deputado
quando nem mesmo sou jurado,
aos que, de bons, se babam: mestre!
inda se escrevo o que não preste,
aos que me julgam primo-irmão
do rei da fava ou do Indostão,
aos que me pensam milionário
se pego aumento de salário
- e aos que me negam cumprimento
sem o mais mínimo argumento,
aos que não sabem que eu existo,
até mesmo quando os assisto,
aos que me trancam sua cara
de carinho alérgica e avara,
aos que me tacham de ultrabeócia
a pretensão de vir da Escócia,
aos que vomitam (sic) meus poemas,
nos mais simples vendo problemas,
aos que, sabendo-me mais pobre,
me negariam pano ou cobre
- eu agradeço humildemente
gesto assim vário e divergente,
graças ao qual, em dois minutos,
tal como o fumo dos charutos,
já subo aos céus, já volvo ao chão,
pois tudo e nada nada são.
Carlos Drummond de Andrade
60 Anos de Poesia, Antologia organizada e apresentada por Arnaldo Saraiva, Edições «O Jornal», Lisboa, Março 1985
Aos que me dão lugar no bonde
e que conheço não sei donde,
aos que me dizem terno adeus,
sem que lhes saiba os nomes seus,
aos que me chamam deputado
quando nem mesmo sou jurado,
aos que, de bons, se babam: mestre!
inda se escrevo o que não preste,
aos que me julgam primo-irmão
do rei da fava ou do Indostão,
aos que me pensam milionário
se pego aumento de salário
- e aos que me negam cumprimento
sem o mais mínimo argumento,
aos que não sabem que eu existo,
até mesmo quando os assisto,
aos que me trancam sua cara
de carinho alérgica e avara,
aos que me tacham de ultrabeócia
a pretensão de vir da Escócia,
aos que vomitam (sic) meus poemas,
nos mais simples vendo problemas,
aos que, sabendo-me mais pobre,
me negariam pano ou cobre
- eu agradeço humildemente
gesto assim vário e divergente,
graças ao qual, em dois minutos,
tal como o fumo dos charutos,
já subo aos céus, já volvo ao chão,
pois tudo e nada nada são.
Carlos Drummond de Andrade
60 Anos de Poesia, Antologia organizada e apresentada por Arnaldo Saraiva, Edições «O Jornal», Lisboa, Março 1985
30.10.12
Veja as diferenças
Com a devida vénia, a ligação para um texto de opinião de Viriato Soromenho Marques:
Veja as diferenças - Opinião - DN
Veja as diferenças - Opinião - DN
24.10.12
19.10.12
MANUEL ANTÓNIO PINA [1943-2012]
As coisas
Há em todas as coisas uma mais-que-coisa
fitando-nos como se dissesse: "Sou eu",
algo que já lá não está ou se perdeu
antes da coisa, e essa perda é que é a coisa.
Em certas tardes altas, absolutas,
quando o mundo por fim nos recebe
como se também nós fôssemos mundo,
a nossa própria ausência é uma coisa.
Então acorda a casa e os livros imaginam-nos
do tamanho da sua solidão.
Também nós tivemos um nome
mas, se alguma vez o ouvimos, não o reconhecemos.
Manuel António Pina
COMO SE DESENHA UMA CASA, Assírio & Alvim, Lisboa, 2011
Há em todas as coisas uma mais-que-coisa
fitando-nos como se dissesse: "Sou eu",
algo que já lá não está ou se perdeu
antes da coisa, e essa perda é que é a coisa.
Em certas tardes altas, absolutas,
quando o mundo por fim nos recebe
como se também nós fôssemos mundo,
a nossa própria ausência é uma coisa.
Então acorda a casa e os livros imaginam-nos
do tamanho da sua solidão.
Também nós tivemos um nome
mas, se alguma vez o ouvimos, não o reconhecemos.
Manuel António Pina
COMO SE DESENHA UMA CASA, Assírio & Alvim, Lisboa, 2011
9.10.12
Do poema como contrato social
Comércio bilingue, o poema precisa da troca,
sobretudo se inútil,
da espontaneidade de poucos, dessa ideia de passagem,
de derrocadas e do silêncio que lhes sucede,
precisa de descendências particularmente radicais
do relâmpago ou de um absurdo ainda maior
para se tornar próximo
O poema é conversa humana
palavra que recuperamos
ao abandonar
José Tolentino Mendonça
ESTAÇÃO CENTRAL, Assírio & Alvim, Lisboa, Setembro de 2012
sobretudo se inútil,
da espontaneidade de poucos, dessa ideia de passagem,
de derrocadas e do silêncio que lhes sucede,
precisa de descendências particularmente radicais
do relâmpago ou de um absurdo ainda maior
para se tornar próximo
O poema é conversa humana
palavra que recuperamos
ao abandonar
José Tolentino Mendonça
ESTAÇÃO CENTRAL, Assírio & Alvim, Lisboa, Setembro de 2012
7.10.12
ZIGUEZAGUE
De repente, parece que nada disto está
nas nossas mãos. O dia começou frio
e aproximam-se ventos fortes. Avistámos
uma patrulha de reconhecimento de longo
alcance. Contactos internacionais
que ultrapassam o nosso entendimento.
A primeira regra de emergência? Avaliar
os recursos disponíveis (talvez uma reza
a S. Judas, padroeiro das causas perdidas).
Mas o progresso avança em ziguezague.
É melhor baixar as velas, todos os homens
ao mastro. Ratinhos indefesos, sem saberem
que a sombra do falcão lhes cobre as costas.
Vítor Nogueira
Comércio Tradicional, Averno, Outubro de 2008
nas nossas mãos. O dia começou frio
e aproximam-se ventos fortes. Avistámos
uma patrulha de reconhecimento de longo
alcance. Contactos internacionais
que ultrapassam o nosso entendimento.
A primeira regra de emergência? Avaliar
os recursos disponíveis (talvez uma reza
a S. Judas, padroeiro das causas perdidas).
Mas o progresso avança em ziguezague.
É melhor baixar as velas, todos os homens
ao mastro. Ratinhos indefesos, sem saberem
que a sombra do falcão lhes cobre as costas.
Vítor Nogueira
Comércio Tradicional, Averno, Outubro de 2008
5.10.12
Jorge de Sena
A Canalha
Como esta gente odeia, como espuma
por entre os dentes podres a sua baba
de tudo sujo sem sequer prazer!
Como se querem reles e mesquinhos,
piolhosos, fétidos e promíscuos
na sarna vergonhosa e pustulenta!
Como se rabialçam de importantes,
fingindo-se de vítimas, vestais,
piedosas prostitutas delicadas!
Como se querem torpes e venais
palhaços pagos da miséria rasca
de seus cafés, popós e brilhantinas!
Há que esmagar a DDT, penicilina
e pau pelos costados tal canalha
de coxos, vesgos, e ladrões e pulhas,
tratá-los como lixo de oito séculos
de um povo que merece melhor gente
para salvá-lo de si mesmo e de outrem.
Jorge de Sena
7 de Dezembro de 1971
Publicado na revista Hífen, Porto, n.º 6, Fevereiro 1991
DEDICÁCIAS seguido de Discurso da Guarda, Guerra e Paz Editores, S.A., Março de 2010
Como esta gente odeia, como espuma
por entre os dentes podres a sua baba
de tudo sujo sem sequer prazer!
Como se querem reles e mesquinhos,
piolhosos, fétidos e promíscuos
na sarna vergonhosa e pustulenta!
Como se rabialçam de importantes,
fingindo-se de vítimas, vestais,
piedosas prostitutas delicadas!
Como se querem torpes e venais
palhaços pagos da miséria rasca
de seus cafés, popós e brilhantinas!
Há que esmagar a DDT, penicilina
e pau pelos costados tal canalha
de coxos, vesgos, e ladrões e pulhas,
tratá-los como lixo de oito séculos
de um povo que merece melhor gente
para salvá-lo de si mesmo e de outrem.
Jorge de Sena
7 de Dezembro de 1971
Publicado na revista Hífen, Porto, n.º 6, Fevereiro 1991
DEDICÁCIAS seguido de Discurso da Guarda, Guerra e Paz Editores, S.A., Março de 2010
2.10.12
Jorge Fazenda Lourenço
20031213 (1)
Há poetas que como
As maçãs, isto é,
Caem de podres ou
Entra-lhes o bicho e
Caem de podres ou
Fazem-se d'estrume
Poetas.
Jorge Fazenda Lourenço
Cutucando a musa com verso longo e curto e outras coisas leves e pesadas, Relógio D'Água Editores, Lisboa, Novembro de 2009
Há poetas que como
As maçãs, isto é,
Caem de podres ou
Entra-lhes o bicho e
Caem de podres ou
Fazem-se d'estrume
Poetas.
Jorge Fazenda Lourenço
Cutucando a musa com verso longo e curto e outras coisas leves e pesadas, Relógio D'Água Editores, Lisboa, Novembro de 2009
22.9.12
Acordai
Música: Fernando Lopes Graça
Poema: José Gomes Ferreira
Interpretação: Coro de Câmara Lisboa Cantat
19.9.12
15.9.12
14.9.12
[O ódio é uma faca]
O ódio é uma faca
na bainha
pronta a ser usada.
Porque deixas
que as lágrimas no sangue
te desarmem?
Egito Gonçalves
O FÓSFORO NA PALHA, Publicações Dom Quixote, Lisboa, Abril de 1970
na bainha
pronta a ser usada.
Porque deixas
que as lágrimas no sangue
te desarmem?
Egito Gonçalves
O FÓSFORO NA PALHA, Publicações Dom Quixote, Lisboa, Abril de 1970
8.9.12
O ABUTRE
Arrastando a sua fome através do céu
do meu crânio concha de céu e da terra
mergulhando sobre os tombados de borco
que breve deverão retomar a vida e andar
escarnecido por um tecido que poderá não
[servir
até que a fome a terra e o céu se convertam
[em refugo.
Samuel Beckett
POEMAS ESCOLHIDOS, Antologia organizada por Magnus Hedlund, tradução Jorge Rosa e Armando da Silva Carvalho, Publicações Dom Quixote, Lisboa, Março de 1970
do meu crânio concha de céu e da terra
mergulhando sobre os tombados de borco
que breve deverão retomar a vida e andar
escarnecido por um tecido que poderá não
[servir
até que a fome a terra e o céu se convertam
[em refugo.
Samuel Beckett
POEMAS ESCOLHIDOS, Antologia organizada por Magnus Hedlund, tradução Jorge Rosa e Armando da Silva Carvalho, Publicações Dom Quixote, Lisboa, Março de 1970
1.9.12
GLOSA DE UM POEMA DE JORGE RIECHMANN
Quando estiveres
entre aqueles
que nunca lêem poemas,
lê-lhes um poema. Quando estiveres
entre aqueles
que escrevem poemas,
não lhes fales de poemas;
fala-lhes daqueles que nunca lêem poemas.
Luís Filipe Parrado
DEITAR A LÍNGUA DE FORA (Vários Autores), Língua Morta, Julho de 2012
entre aqueles
que nunca lêem poemas,
lê-lhes um poema. Quando estiveres
entre aqueles
que escrevem poemas,
não lhes fales de poemas;
fala-lhes daqueles que nunca lêem poemas.
Luís Filipe Parrado
DEITAR A LÍNGUA DE FORA (Vários Autores), Língua Morta, Julho de 2012
26.8.12
declaração de rendimentos
no meio de tanta incerteza. "é a prosa da
vida que faz falta a muita gente". sentença de escritor.
roubam-te a esperança. o fundo olhar da paixão.
chegam-se a ti com
um fósforo. e querem levar
tudo. a troco de um esgar. cotado em bolsa.
querem vampirizar o ar que
respiras. cuida. meu amor. cuida da prosa.
do vagaroso espreguiçar da palavra. leva-a.
no cesto da fruta. antes
que apodreça na casca endividada.
querem que os teus olhos. calem. as fogueiras. a alegria.
o sol. que te
venderam. como só teu. e agora. cobram juros.
porque existe. porque sim. é preciso cortar em tudo. dizem.
porque o
sol também é um assalariado.
e a luz que lhe assiste. (à excepção dos senhores
que lhe sugaram a
energia. toda. renovável). tem custos.
umas manhãs às escuras. ou. uns poentes apagados.
consolidam as finanças.
sabes amor. estamos na boca da turbina. de assépticos.
predadores. cuida amor.
guarda a palavra. semeia-a no ventre. inventa-a.
na dança silenciosa
dos teus lábios.
a palavra. em prosa serena. que ainda.
não paga IVA. se já te arrancaram o fôlego.
para pagar os juros da
dívida. salva. a imaginação que (ainda) não é tributada.
Alberto Serra
morrer de vagar, Edição Temas Originais, Lda., Coimbra, 2012
vida que faz falta a muita gente". sentença de escritor.
roubam-te a esperança. o fundo olhar da paixão.
chegam-se a ti com
um fósforo. e querem levar
tudo. a troco de um esgar. cotado em bolsa.
querem vampirizar o ar que
respiras. cuida. meu amor. cuida da prosa.
do vagaroso espreguiçar da palavra. leva-a.
no cesto da fruta. antes
que apodreça na casca endividada.
querem que os teus olhos. calem. as fogueiras. a alegria.
o sol. que te
venderam. como só teu. e agora. cobram juros.
porque existe. porque sim. é preciso cortar em tudo. dizem.
porque o
sol também é um assalariado.
e a luz que lhe assiste. (à excepção dos senhores
que lhe sugaram a
energia. toda. renovável). tem custos.
umas manhãs às escuras. ou. uns poentes apagados.
consolidam as finanças.
sabes amor. estamos na boca da turbina. de assépticos.
predadores. cuida amor.
guarda a palavra. semeia-a no ventre. inventa-a.
na dança silenciosa
dos teus lábios.
a palavra. em prosa serena. que ainda.
não paga IVA. se já te arrancaram o fôlego.
para pagar os juros da
dívida. salva. a imaginação que (ainda) não é tributada.
Alberto Serra
morrer de vagar, Edição Temas Originais, Lda., Coimbra, 2012
23.8.12
NOVA
grita
de modo
a
retirares
de
cada
sopro
uma semente.
João Silveira
Agio, Revista de Literatura, Fevereiro 2011, Edição Artefacto, Lisboa
de modo
a
retirares
de
cada
sopro
uma semente.
João Silveira
Agio, Revista de Literatura, Fevereiro 2011, Edição Artefacto, Lisboa
18.8.12
O MORTO: SUA ASTRONOMIA
A astronomia do morto é um grito
sem resposta. Necessita de um computador
que lhe diga como descer da constelação:
alfabetos escadas da dor. Os olhos entendem sem ouvir
as suas equações do movimento: cinemáticas!
Quanto a mim bastava-lhe a tristeza: peso
cadente das estrelas e os hieroglifos eternos
das esquinas da história e da histeria.
Rancor enxertado por decretos e votos e hinos.
É terrível ser homem moribundo. A morte
levanta a sua constelação para que eu morra.
Nem há mesmo outra astronomia.
Alexandre Pinheiro Torres
A Flor Evaporada, Publicações Dom Quixote, Lisboa, 1984
sem resposta. Necessita de um computador
que lhe diga como descer da constelação:
alfabetos escadas da dor. Os olhos entendem sem ouvir
as suas equações do movimento: cinemáticas!
Quanto a mim bastava-lhe a tristeza: peso
cadente das estrelas e os hieroglifos eternos
das esquinas da história e da histeria.
Rancor enxertado por decretos e votos e hinos.
É terrível ser homem moribundo. A morte
levanta a sua constelação para que eu morra.
Nem há mesmo outra astronomia.
Alexandre Pinheiro Torres
A Flor Evaporada, Publicações Dom Quixote, Lisboa, 1984
15.8.12
[A mentira que fingem]
A mentira que fingem
é verdade.
A submissão
corrompe. Não nasceram
ainda.
Poderão nascer
mais tarde
tão adultos de aspecto?
Egito Gonçalves
O FÓSFORO NA PALHA, Publicações Dom Quixote, Lisboa, Abril de 1970
é verdade.
A submissão
corrompe. Não nasceram
ainda.
Poderão nascer
mais tarde
tão adultos de aspecto?
Egito Gonçalves
O FÓSFORO NA PALHA, Publicações Dom Quixote, Lisboa, Abril de 1970
14.8.12
O ENFORCADO
No gesto suspensivo de um sobreiro,
o enforcado.
Badalo que ninguém ouve,
espantalho que ninguém vê,
suas botas recusam o chão que o rejeitou.
Dele sobra o cajado.
Alexandre O'Neill
POESIAS COMPLETAS, Assírio & Alvim, 5.ª Edição, Lisboa, Maio de 2007
o enforcado.
Badalo que ninguém ouve,
espantalho que ninguém vê,
suas botas recusam o chão que o rejeitou.
Dele sobra o cajado.
Alexandre O'Neill
POESIAS COMPLETAS, Assírio & Alvim, 5.ª Edição, Lisboa, Maio de 2007
12.8.12
o só
Na longa alameda a luz aos pedaços cai
mole do alto dos postes. Ele olha.
Para que não doa, apenas olha.
E não dói.
Eucanaã Ferraz
Cinemateca, Quasi Edições, Fevereiro de 2009
mole do alto dos postes. Ele olha.
Para que não doa, apenas olha.
E não dói.
Eucanaã Ferraz
Cinemateca, Quasi Edições, Fevereiro de 2009
11.8.12
BILHETE-POSTAL NEGRO
I
Calendário repleto de compromissos, futuro incerto.
O rádio trauteia uma canção popular sem nacionalidade.
Cai neve no mar totalmente gelado. Vultos
acotovelam-se no cais.
II
Acontece, a meio da vida, a morte bater-nos à porta
e tomar-nos as medidas. Essa visita é esquecida,
e a vida continua. O fato, porém, esse
é cosido em silêncio.
Tomas Tranströmer
50 Poemas, Tradução de Alexandre Pastor, Relógio D'Água Editores, Lisboa, julho de 2012
Calendário repleto de compromissos, futuro incerto.
O rádio trauteia uma canção popular sem nacionalidade.
Cai neve no mar totalmente gelado. Vultos
acotovelam-se no cais.
II
Acontece, a meio da vida, a morte bater-nos à porta
e tomar-nos as medidas. Essa visita é esquecida,
e a vida continua. O fato, porém, esse
é cosido em silêncio.
Tomas Tranströmer
50 Poemas, Tradução de Alexandre Pastor, Relógio D'Água Editores, Lisboa, julho de 2012
25.7.12
Di Versos - Revista de Poesia e Tradução - N.º 17
Das Edições Sempre-em-Pé, surgiu nas livrarias a Revista Di Versos - Poesia e Tradução / n.º 17 - julho de 2012.
Com poemas de autores estrangeiros, muitos deles em versão bilingue, e alguns inéditos de autores portugueses, este número da revista alia-se à "celebração de 60 anos de poesia de Albano Martins", com uma brevíssima antologia realizada por José Carlos Marques, a partir do livro As Escarpas dos Dias, Poesia 1950-2010 (Porto, Edições Afrontamento, Maio de 2010).
21.7.12
Helena Cidade Moura [1924 - 2012]
Com a devida vénia, e o meu pesar por esta infausta notícia (que foi colhida no blogue de Amadeu Baptista): Helena Cidade Moura, responsável pela maior campanha de alfabetização organizada em Portugal no pós-25 de Abril, faleceu na sexta-feira,...
19.7.12
9.7.12
7.7.12
Onze meditações sobre a ira
6.
Sei de lugares onde
não prospera nenhuma
forma de ira.
Eu nunca frequentei
tão sórdidos lugares.
A. M. Pires Cabral
[O LIVRO DOS LUGARES E OUTROS POEMAS], ANTES QUE O RIO SEQUE, Assírio & Alvim, Lisboa, Outubro 2006
Sei de lugares onde
não prospera nenhuma
forma de ira.
Eu nunca frequentei
tão sórdidos lugares.
A. M. Pires Cabral
[O LIVRO DOS LUGARES E OUTROS POEMAS], ANTES QUE O RIO SEQUE, Assírio & Alvim, Lisboa, Outubro 2006
2.7.12
Bonjour
Com a devida vénia, reprodução colhida no blogue de J. Rentes de Carvalho, TEMPO CONTADO: Bonjour
28.6.12
"na mesa amarela" - de Ulisses Duarte
Colhido no grupo, Poetas esquecidos, do Facebook, apud Daniel Almeida Pinto
18.6.12
As Bombas
Não há mais palavras a dizer
Só ficámos com as bombas
Que estouram dentro das nossas cabeças
Só ficaram as bombas
Que nos chupam o último sangue
Só ficámos com as bombas
Que dão lustro aos crânios dos mortos
Fevereiro 2003
Harold Pinter
GUERRA, Tradução de Pedro Marques, Jorge Silva Melo e Francisco Frazão, Quasi Edições, Junho de 2003
Só ficámos com as bombas
Que estouram dentro das nossas cabeças
Só ficaram as bombas
Que nos chupam o último sangue
Só ficámos com as bombas
Que dão lustro aos crânios dos mortos
Fevereiro 2003
Harold Pinter
GUERRA, Tradução de Pedro Marques, Jorge Silva Melo e Francisco Frazão, Quasi Edições, Junho de 2003
17.6.12
RECADO AOS CORVOS
Levai tudo:
o brilho fácil das pratas,
o acre toque das sedas.
Deixai só a incombustível
memória das labaredas.
A. M. Pires Cabral
[COMO SE BOSCH TIVESSE ENLOUQUECIDO], in ANTES QUE O RIO SEQUE poesia reunida, Assírio & Alvim, Lisboa, Outubro de 2006
o brilho fácil das pratas,
o acre toque das sedas.
Deixai só a incombustível
memória das labaredas.
A. M. Pires Cabral
[COMO SE BOSCH TIVESSE ENLOUQUECIDO], in ANTES QUE O RIO SEQUE poesia reunida, Assírio & Alvim, Lisboa, Outubro de 2006
10.6.12
CAMÕES E A TENÇA
Irás ao Paço. Irás pedir que a tença
Seja paga na data combinada
Este país te mata lentamente
País que tu chamaste e não responde
País que tu nomeias e não nasce
Em tua perdição se conjuraram
Calúnias desamor inveja ardente
E sempre os inimigos sobejaram
A quem ousou seu ser inteiramente
E aqueles que invocaste não te viram
Porque estavam curvados e dobrados
Pela paciência cuja mão de cinza
Tinha apagado os olhos no seu rosto
Irás ao Paço irás pacientemente
Pois não te pedem canto mas paciência
Este país te mata lentamente
Sophia de Mello Breyner Andresen
OBRA POÉTICA III (2.ª Edição), Caminho, Agosto de 1996
Seja paga na data combinada
Este país te mata lentamente
País que tu chamaste e não responde
País que tu nomeias e não nasce
Em tua perdição se conjuraram
Calúnias desamor inveja ardente
E sempre os inimigos sobejaram
A quem ousou seu ser inteiramente
E aqueles que invocaste não te viram
Porque estavam curvados e dobrados
Pela paciência cuja mão de cinza
Tinha apagado os olhos no seu rosto
Irás ao Paço irás pacientemente
Pois não te pedem canto mas paciência
Este país te mata lentamente
Sophia de Mello Breyner Andresen
OBRA POÉTICA III (2.ª Edição), Caminho, Agosto de 1996
5.6.12
APARTE
No verso me integrei, decassilábico,
que aprecio, tão sóbrio e tão lacónico;
se em vez de ser heróico ele for sáfico,
troca o ser incisivo por eufónico.
O verso alexandrino é redundante
e, quando colocado num soneto,
o soneto se torna exuberante,
perde o tom que lhe é próprio, o ar discreto.
O soneto insubmisso tenta o poeta:
incerto mas ardente - esquiva chama.
Como O'Neill "pedalando a bicicleta"
e, como "a custo", Sebastião da Gama.
Perdoem! misturei técnica e arte:
isto não é um soneto, é um aparte.
Armando Pinheiro
Sonetos Plurais, Gota de Água
que aprecio, tão sóbrio e tão lacónico;
se em vez de ser heróico ele for sáfico,
troca o ser incisivo por eufónico.
O verso alexandrino é redundante
e, quando colocado num soneto,
o soneto se torna exuberante,
perde o tom que lhe é próprio, o ar discreto.
O soneto insubmisso tenta o poeta:
incerto mas ardente - esquiva chama.
Como O'Neill "pedalando a bicicleta"
e, como "a custo", Sebastião da Gama.
Perdoem! misturei técnica e arte:
isto não é um soneto, é um aparte.
Armando Pinheiro
Sonetos Plurais, Gota de Água
2.6.12
Esposo serve vinho à mulher para almejar seus favores
Toma. Isso. Bebe tudo. É
um Porto de 85. Delidos pelo sofá deixemos
que deste vinho nos dê de beber
Dioniso. Escolher um sofá de sala
já devia precaver duas ou três características:
ser largo como o fastio
(profundo
como o quebranto) tão
longo como a preguiça. Isso. Mais?
Bebe tudo. Há
depois esses que adestram
(ébrios de vinho e poesia) o
tédio da burguesia.
João Luís Barreto Guimarães
Poesia Reunida, Posfácio de José Ricardo Nunes, Quetzal Editores, Lisboa, Outubro de 2011
(Nota: no v. 4.º deste poema, na edição do livro Luz Última, em vez de Dioniso, lê-se, Dionísio).
um Porto de 85. Delidos pelo sofá deixemos
que deste vinho nos dê de beber
Dioniso. Escolher um sofá de sala
já devia precaver duas ou três características:
ser largo como o fastio
(profundo
como o quebranto) tão
longo como a preguiça. Isso. Mais?
Bebe tudo. Há
depois esses que adestram
(ébrios de vinho e poesia) o
tédio da burguesia.
João Luís Barreto Guimarães
Poesia Reunida, Posfácio de José Ricardo Nunes, Quetzal Editores, Lisboa, Outubro de 2011
(Nota: no v. 4.º deste poema, na edição do livro Luz Última, em vez de Dioniso, lê-se, Dionísio).
23.5.12
ILUMINAÇÃO NA PONTE DE LEÇA
Arranca Pára
Pára Arranca
De súbito a tua cara
a tua barba branca
Em cima de um contentor
manobrando um guindaste
Pai Pai porque
me abandonaste?
Jorge Sousa Braga
O NOVÍSSIMO TESTAMENTO e outros poemas, Assírio & Alvim, Lisboa, Abril de 2012
Pára Arranca
De súbito a tua cara
a tua barba branca
Em cima de um contentor
manobrando um guindaste
Pai Pai porque
me abandonaste?
Jorge Sousa Braga
O NOVÍSSIMO TESTAMENTO e outros poemas, Assírio & Alvim, Lisboa, Abril de 2012
19.5.12
"Este coiso"
Parafraseando o conselho do Livro dos Conselhos, em epígrafe, acrescento: se podes ouvir, escuta:
�lvaro Santos Pereira - O coiso by Alex Guerreiro
�lvaro Santos Pereira - O coiso by Alex Guerreiro
16.5.12
[A mesa está suja]
A mesa está suja
e a cadeira tem restos mortais
de tanta gente.
Onde pousar a próxima dúvida?
Rosa Alice Branco
CONCERTO AO VIVO, & etc, 2012
e a cadeira tem restos mortais
de tanta gente.
Onde pousar a próxima dúvida?
Rosa Alice Branco
CONCERTO AO VIVO, & etc, 2012
13.5.12
CARLOS PAREDES, 1990
Tinha pedido uma cerveja,
um pires de caracóis
e uma espécie de cinzeiro,
em frente ao convento do Carmo.
Aí mesmo tive de saber
a morte de Carlos Paredes.
Fazia sentido: ali mesmo,
entre ruínas, assisti
a um dos seus últimos concertos.
Era outro o céu - o céu
pobre de Lisboa, caindo
sobre a minha juventude. Mas
parece tão igual a perda,
o silêncio parado das mãos.
Quando o desastre chega,
pedimos mais cerveja
e aceitamos, por fim,
o calmo desfavor dos versos.
Manuel de Freitas
JUKEBOX, Edição Teatro de Vila Real, Abril, 2005
um pires de caracóis
e uma espécie de cinzeiro,
em frente ao convento do Carmo.
Aí mesmo tive de saber
a morte de Carlos Paredes.
Fazia sentido: ali mesmo,
entre ruínas, assisti
a um dos seus últimos concertos.
Era outro o céu - o céu
pobre de Lisboa, caindo
sobre a minha juventude. Mas
parece tão igual a perda,
o silêncio parado das mãos.
Quando o desastre chega,
pedimos mais cerveja
e aceitamos, por fim,
o calmo desfavor dos versos.
Manuel de Freitas
JUKEBOX, Edição Teatro de Vila Real, Abril, 2005
11.5.12
Bernardo Sassetti - Da Noite - Ao Silêncio
Junto, com a devida vénia, de um belo poema de Eugénio de Andrade:
"Faltava-te essa música ainda,
a do silêncio, fria de tão nua,
agora para sempre e sempre tua."
9.5.12
O Governo invisível
Com a devida vénia, um artigo de opinião de Baptista-Bastos que vale a pena ler, pois também por cá se sente duramente «o governo invisível dos poderosos» e dos seus títeres de turno:
O Governo invisível - Opinião - DN
O Governo invisível - Opinião - DN
30.4.12
12.4.12
Entrevista com Samir Amin - O mundo visto do Sul - aviagemdosargonautas
Com a devida vénia, vale a pena ler:
Entrevista com Samir Amin - O mundo visto do Sul - aviagemdosargonautas
Entrevista com Samir Amin - O mundo visto do Sul - aviagemdosargonautas
6.4.12
MICENAS
Por algumas
moedas de cobre compra-se
o ouro do tempo.
Albano Martins
CASTÁLIA E OUTROS POEMAS, Campo das Letras - Editores, S.A., Porto, Maio de 2001
moedas de cobre compra-se
o ouro do tempo.
Albano Martins
CASTÁLIA E OUTROS POEMAS, Campo das Letras - Editores, S.A., Porto, Maio de 2001
25.3.12
O QUE DIZ O RATO
Tenho um destino. Nasci
para roer o silêncio - e vou roê-lo
metodicamente
até que um dia se invertam os papéis
e seja o silêncio a roer-me a mim.
A. M. Pires Cabral
COBRA-D'ÁGUA, Edições Cotovia, Lda., Lisboa, 2011
para roer o silêncio - e vou roê-lo
metodicamente
até que um dia se invertam os papéis
e seja o silêncio a roer-me a mim.
A. M. Pires Cabral
COBRA-D'ÁGUA, Edições Cotovia, Lda., Lisboa, 2011
23.3.12
PENHORES
Aros esmaecidos, os anéis repousam
em brilhos desertos. Quantas
histórias banais, com o letreiro de
ouro usado. Nessa dúbia cor, uma
nobre tristeza resgata
os formatos vulgares e desenha
velhas parábolas
de purgatório e redenção.
Inês Lourenço
TEORIA DA IMUNIDADE, Edição Felício & Cabral - Publicações, Lda, Porto, Dezembro de 1966
em brilhos desertos. Quantas
histórias banais, com o letreiro de
ouro usado. Nessa dúbia cor, uma
nobre tristeza resgata
os formatos vulgares e desenha
velhas parábolas
de purgatório e redenção.
Inês Lourenço
TEORIA DA IMUNIDADE, Edição Felício & Cabral - Publicações, Lda, Porto, Dezembro de 1966
18.3.12
10.3.12
DANOS COLATERAIS
- A tristeza não tem futuro,
sussurra-me esta sexta de Março.
Eu amaldiçoo as nuvens escuras,
e ela desperta uma torrente de pássaros.
Eu só vejo sangue nas coisas,
ela lava com água as minhas mãos.
O café não me sabe a manhã,
e ela sugere promessas de sábado.
- A esperança é a última a morrer,
repete-me esta sexta de Março.
Os jornais cheiram a morte,
e ela traz-me uma página em branco.
Ángel Mendoza
criatura N.º 6 . Novembro . 2011, Selecção e tradução de Inês Dias, Organizado pelo Núcleo Autónomo Calíope da Associação Académica da Faculdade de Direito de Lisboa
sussurra-me esta sexta de Março.
Eu amaldiçoo as nuvens escuras,
e ela desperta uma torrente de pássaros.
Eu só vejo sangue nas coisas,
ela lava com água as minhas mãos.
O café não me sabe a manhã,
e ela sugere promessas de sábado.
- A esperança é a última a morrer,
repete-me esta sexta de Março.
Os jornais cheiram a morte,
e ela traz-me uma página em branco.
Ángel Mendoza
criatura N.º 6 . Novembro . 2011, Selecção e tradução de Inês Dias, Organizado pelo Núcleo Autónomo Calíope da Associação Académica da Faculdade de Direito de Lisboa
7.3.12
TERRITÓRIO
Um céu de sombras
vermelho por dentro
clareira solta
sobre o mar
O sonho como um galo branco
iluminando a noite
para que os ossos da névoa
ganhem contornos de pele
Um pássaro vibrando
na solidão de cada ferida
O granítico ódio
destas ruas sem rostos
deste pranto sem corpo
de país castigado
José Manuel de Vasconcelos
A MÃO NA ÁGUA QUE CORRE, Assírio & Alvim, Lisboa, Março 2011
vermelho por dentro
clareira solta
sobre o mar
O sonho como um galo branco
iluminando a noite
para que os ossos da névoa
ganhem contornos de pele
Um pássaro vibrando
na solidão de cada ferida
O granítico ódio
destas ruas sem rostos
deste pranto sem corpo
de país castigado
José Manuel de Vasconcelos
A MÃO NA ÁGUA QUE CORRE, Assírio & Alvim, Lisboa, Março 2011
2.3.12
A Terceira Miséria
20.
E veio outra miséria, em interlúdio:
A miséria da interpretação
Que tudo trai. Os textos, os tão belos
Textos do ódio e da melancolia
Carregavam os sacos dos soldados
Como pães doces, abolorecidos,
Alimentavam quem? Persas, de novo.
Persas vindos do Norte, equivocados
Com o som do poema, com a ira
Formosa do poema.
Hélia Correia
A Terceira Miséria, Relógio D'Água Editores, Fevereiro de 2012
E veio outra miséria, em interlúdio:
A miséria da interpretação
Que tudo trai. Os textos, os tão belos
Textos do ódio e da melancolia
Carregavam os sacos dos soldados
Como pães doces, abolorecidos,
Alimentavam quem? Persas, de novo.
Persas vindos do Norte, equivocados
Com o som do poema, com a ira
Formosa do poema.
Hélia Correia
A Terceira Miséria, Relógio D'Água Editores, Fevereiro de 2012
27.2.12
Ensaísta e poeta à conversa nas Correntes d'Escrita - Renascença
Com a devida vénia, uma conversa da jornalista Maria João Costa, na Rádio Renascença, com Eduardo Lourenço e Manuel António Pina:
Ensaísta e poeta à conversa nas Correntes d'Escrita - Renascença
Ensaísta e poeta à conversa nas Correntes d'Escrita - Renascença
21.2.12
Manuel António Pina
Com a devida vénia, uma excelente entrevista:
Manuel António Pina. “A vontade que tenho era pôr um cinturão de bombas e rebentar com essa malta toda” iOnline
Manuel António Pina. “A vontade que tenho era pôr um cinturão de bombas e rebentar com essa malta toda” iOnline
12.2.12
OS GRANDES AMIGOS
São como as árvores
de grande porte.
Quando elas partem
as raízes ficam
aquém da morte
1987
Luís Veiga Leitão
POESIA COMPLETA, Organização de Luís Adriano Carlos e Paula Monteiro Apresentação crítica de Luís Adriano Carlos, Asa Editores, S.A., Porto, Setembro de 2005
de grande porte.
Quando elas partem
as raízes ficam
aquém da morte
1987
Luís Veiga Leitão
POESIA COMPLETA, Organização de Luís Adriano Carlos e Paula Monteiro Apresentação crítica de Luís Adriano Carlos, Asa Editores, S.A., Porto, Setembro de 2005
7.2.12
DESVERSOS
2.
Este ministro é um mentiroso
que agonia quando ele discursa
e se fosse só isso: bale sem jeito
às meias horas seguidas - e não pára!
bem-aventurados os duros de ouvido
a quem o céu abrirá as portas
desliguem p.f. o microfone
ou então tirem o país da ficha
Lisboa
6-V-95
Fernando Assis Pacheco
RESPIRAÇÃO ASSISTIDA, Assírio & Alvim, Lisboa, Novembro 2003
Este ministro é um mentiroso
que agonia quando ele discursa
e se fosse só isso: bale sem jeito
às meias horas seguidas - e não pára!
bem-aventurados os duros de ouvido
a quem o céu abrirá as portas
desliguem p.f. o microfone
ou então tirem o país da ficha
Lisboa
6-V-95
Fernando Assis Pacheco
RESPIRAÇÃO ASSISTIDA, Assírio & Alvim, Lisboa, Novembro 2003
1.2.12
POUPANÇAS
A teu lado não me importam as notícias,
que tivemos o Inverno mais seco de sempre,
e a guerra, o petróleo, o bulício dos tolos.
Os jornais não trazem nada que me possa
interessar: que aprendeste finalmente a cair
de bicicleta, tens consulta para ontem
com o médico das costas e o teu sono
continua perturbado por afãs de perfeição
O amor é assim, deixa o logro do mundo
a ganir à porta. Vai tu à janela, se queres,
e atira-lhe um osso de atenção. Eu já não
creio que a história seja o melhor amigo
do homem - tu sim, felicidade perceptível,
âncora do tempo, senhora do Marão. Graças
a ti já comecei a poupar uns oito euros
por semana em semanários, arrelias e afins.
José Miguel Silva
SERÉM, 24 DE MARÇO, Averno, Novembro de 2011
que tivemos o Inverno mais seco de sempre,
e a guerra, o petróleo, o bulício dos tolos.
Os jornais não trazem nada que me possa
interessar: que aprendeste finalmente a cair
de bicicleta, tens consulta para ontem
com o médico das costas e o teu sono
continua perturbado por afãs de perfeição
O amor é assim, deixa o logro do mundo
a ganir à porta. Vai tu à janela, se queres,
e atira-lhe um osso de atenção. Eu já não
creio que a história seja o melhor amigo
do homem - tu sim, felicidade perceptível,
âncora do tempo, senhora do Marão. Graças
a ti já comecei a poupar uns oito euros
por semana em semanários, arrelias e afins.
José Miguel Silva
SERÉM, 24 DE MARÇO, Averno, Novembro de 2011
29.1.12
AMAZÓNIA
IX
Corpos.
Rijos, secos
como troncos velhos.
Cepos.
Charcos de cachaça
e de suor.
Marés de força baça,
roída
e carcomida
de sóis e de torpor.
Mirrando.
Como os frutos
murchando,
como águas a estagnar.
Atlânticos mortos
de mundos a secar.
O sol e a selva
sem destroços.
- A vida é fome
à flor dos ossos.
Carlos de Oliveira
TURISMO, in NOVO CANCIONEIRO, Prefácio, Organização e Notas de Alexandre Pinheiro Torres, Editorial Caminho, Lisboa, Dezembro de 1989
Corpos.
Rijos, secos
como troncos velhos.
Cepos.
Charcos de cachaça
e de suor.
Marés de força baça,
roída
e carcomida
de sóis e de torpor.
Mirrando.
Como os frutos
murchando,
como águas a estagnar.
Atlânticos mortos
de mundos a secar.
O sol e a selva
sem destroços.
- A vida é fome
à flor dos ossos.
Carlos de Oliveira
TURISMO, in NOVO CANCIONEIRO, Prefácio, Organização e Notas de Alexandre Pinheiro Torres, Editorial Caminho, Lisboa, Dezembro de 1989
21.1.12
LIVRARIA ACADÉMICA
Todas as quartas-feiras entras
na Livraria Académica passas
os olhos pelas lombadas
dos livros alinhados sobre
o balcão folheias um ou
outro devagar... O que procuras
entre tanta prosa amare-
lecida? Uma palavra que
justifique a tua vida.
Jorge Sousa Braga
PORTO DE ABRIGO, Assírio & Alvim, Lisboa, Novembro de 2005
19.1.12
RUI COSTA [1972-2012]
A notícia de pesar colhida no blogue, Da Literatura: RUI COSTA 1972-2012.
(A imagem foi retirada daqui).
17.1.12
LENDO HORÁCIO
Nem o próprio dilúvio
Foi eterno.
Um dia as negras
Águas partiram. Mas como,
É verdade, houve poucos
Sobreviventes.
Bertolt Brecht
Poemas, Tradução (Com colaboração de Sylvie Daswarte) Selecção, Estudos e Notas de Arnaldo Saraiva, Editorial Presença, Lda., Lisboa
Foi eterno.
Um dia as negras
Águas partiram. Mas como,
É verdade, houve poucos
Sobreviventes.
Bertolt Brecht
Poemas, Tradução (Com colaboração de Sylvie Daswarte) Selecção, Estudos e Notas de Arnaldo Saraiva, Editorial Presença, Lda., Lisboa
11.1.12
Páginas de Filosofia: Entrevista com Paul Ricoeur (1976)
Com a devida vénia, do blogue Páginas de Filosofia: Entrevista com Paul Ricoeur (1976)
10.1.12
"A rede do poder corporativo mundial"
Leia-se [aqui] o esclarecedor artigo do economista brasileiro Ladislau Dowbor.
7.1.12
A Ordem Criminosa do Mundo / El Orden Criminal del Mundo
nunca é demais alertar para esta (des)ordem mundial.
4.1.12
Gerald Celente: Acabemos com esta farsa de democracia
Como estamos no olho furacão, vale a pena escutar outras opiniões sobre a maldita crise.
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