28.6.12

"na mesa amarela" - de Ulisses Duarte



Colhido no grupo, Poetas esquecidos, do Facebook, apud Daniel Almeida Pinto

18.6.12

As Bombas

Não há mais palavras a dizer
Só ficámos com as bombas
Que estouram dentro das nossas cabeças
Só ficaram as bombas
Que nos chupam o último sangue
Só ficámos com as bombas
Que dão lustro aos crânios dos mortos

Fevereiro 2003

Harold Pinter

GUERRA, Tradução de Pedro Marques, Jorge Silva Melo e Francisco Frazão, Quasi Edições, Junho de 2003

Arquivo morto

 EscritArtes - Menção de qualidade poesia (Dezembro 2008) - Domingos da Mota

17.6.12

RECADO AOS CORVOS

Levai tudo:
o brilho fácil das pratas,
o acre toque das sedas.

Deixai só a incombustível
memória das labaredas.

A. M. Pires Cabral

[COMO SE BOSCH TIVESSE ENLOUQUECIDO], in ANTES QUE O RIO SEQUE  poesia reunida, Assírio & Alvim, Lisboa, Outubro de 2006

10.6.12

CAMÕES E A TENÇA

Irás ao Paço. Irás pedir que a tença
Seja paga na data combinada
Este país te mata lentamente
País que tu chamaste e não responde
País que tu nomeias e não nasce

Em tua perdição se conjuraram
Calúnias desamor inveja ardente
E sempre os inimigos sobejaram
A quem ousou  seu ser inteiramente

E aqueles que invocaste não te viram
Porque estavam curvados e dobrados
Pela paciência cuja mão de cinza
Tinha apagado os olhos no seu rosto

Irás ao Paço irás pacientemente
Pois não te pedem canto mas paciência

Este país te mata lentamente

Sophia de Mello Breyner Andresen

OBRA POÉTICA III (2.ª Edição), Caminho, Agosto de 1996

5.6.12

APARTE

No verso me integrei, decassilábico,
que aprecio, tão sóbrio e tão lacónico;
se em vez de ser heróico ele for sáfico,
troca o ser incisivo por eufónico.

O verso alexandrino é redundante
e, quando colocado num soneto,
o soneto se torna exuberante,
perde o tom que lhe é próprio, o ar discreto.

O soneto insubmisso tenta o poeta:
incerto mas ardente - esquiva chama.
Como O'Neill "pedalando a bicicleta"
e, como "a custo", Sebastião da Gama.

Perdoem! misturei técnica e arte:
isto não é um soneto, é um aparte.

Armando Pinheiro

Sonetos Plurais, Gota de Água

2.6.12

Esposo serve vinho à mulher para almejar seus favores

Toma. Isso. Bebe tudo. É
um Porto de 85. Delidos pelo sofá deixemos
que deste vinho nos dê de beber
Dioniso. Escolher um sofá de sala
já devia precaver duas ou três características:
ser largo como o fastio
(profundo
como o quebranto) tão
longo como a preguiça. Isso. Mais?
Bebe tudo. Há
depois esses que adestram
(ébrios de vinho e poesia) o
tédio da burguesia.

João Luís Barreto Guimarães

Poesia Reunida, Posfácio de José Ricardo Nunes, Quetzal Editores, Lisboa, Outubro de 2011
(Nota: no v. 4.º deste poema, na edição do livro Luz Última, em vez de Dioniso, lê-se, Dionísio).