27.3.25

[Se o homem foge]

Se o homem foge,
foge a debates,
e não esclarece:
vá pra penates!

Para penates
e spinumviva.
Orate fratres?
Nem-sei-que-diga!


Domingos da Mota

15.3.25

Comentador(a)

Com tanta parcialidade,

mais papista que o papa,

da distorção da verdade,

mesmo que tente, não escapa.


Domingos da Mota

7.3.25

das avenças, desavenças e moções

eu não acumulei coisa nenhuma
eu não acumulei coisa
eu não acumulei
eu não
eu

*

tu? 
tu não? 
tu não acumulaste?
tu não acumulaste coisa?
tu não acumulaste coisa nenhuma?

DM

28.2.25

Das avenças

Avenças

desavenças

crenças

descrenças:

tenças

quão tensas?


DM

26.2.25

Ubiquidade

Com o dom da ubiquidade

do centrão para a direita,

onde enraíza a verdade?

Com que máscaras se enfeita?


Domingos da Mota

24.2.25

[Quem apadrinha e faz coro]

Quem apadrinha e faz coro

com as toadas de ódio,

postergando, sem decoro,

que se desate o nó górdio?


Domingos da Mota

19.2.25

Negociações de paz

Enquanto uns partem

pedra, outros projectam

mais pedregulhos


Domingos da Mota

13.2.25

Salvadores

De salvadores estou farto.
Sobretudo se não rima
a práxis do candidato
com a ética que afirma.


Domingos da Mota

9.2.25

Receita para fazer um candidato a presidente

Pega-se num político
de discurso redondo:
dá-se-lhe espaço de
comentário na televisão 
(com jornalista ao lado 
ou teleponto em frente)
de sorriso na lapela:

semanalmente


Domingos da Mota

(a partir do texto "Telepresidentes", de Carlos Matos Gomes, na sua página do Facebook, 08.02.2025)


1.2.25

Toque

Deu-me um toque
virtual.
Que sentido
terá ele

quando o seu
potencial
não o sinto
sobre a pele,

nem o vejo,
nem o escuto,
nem é toque
à la minuta?

O enfoque
nesse toque
imprevisto,
sem aviso,

mais parece
um toc, toc
virtualmente
indeciso.

Domingos da Mota




19.1.25

sonhei

sonhei
que um fogo vindo do céu
devastava a América.

o homem sonha.
se deus quiser
a obra nasce.

Alberto Pimenta


QUE LAREIRAS NA FLORESTA [de as moscas de pégaso], 7 nós, Porto, Janeiro de 2010

8.1.25

Homessa!

Do chocalhar dos ossos (poucos)
na urna, aos discursos insulsos
que a atmosfera
enfuna.

Domingos da Mota

31.12.24

Adília Lopes (1960-2024)

Tenho uma vida
a viver
e uma morte
a morrer


Adília Lopes



LE VITRAIL LA NUIT
A ÁRVORE CORTADA
, & etc, Lisboa, Fevereiro de 2006

21.12.24

Rua do Benformoso


Saiu à rua a feiura,
na rua do Benformoso,
com tiques de ditadura,
pondo em prática a leitura
do discurso capcioso

que repisa, sem razão,
o labéu contra o estrangeiro,
à sombra da percepção
de que será um papão
ou um vulgar candongueiro.

Como se fosse num gueto,
virado para a parede
quem na rua trabalhava,
passeava ou morava,
ou quem tinha mau aspecto,

na rua do Benformoso
adestrou-se a percepção
do poder que, ardiloso,
tem um discurso manhoso
de populista – malsão.


© Domingos da Mota


(Fotografia colhida na página do Facebook de Carlos Matos Gomes)

8.12.24

Avó

minha santíssima avó
com um vestido comprido justo
abotoado
com uma quantidade incontável
de botões
qual orquídea
qual arquipélago
qual constelação

sento-me no seu colo
e ela conta-me
o universo
de sexta
a domingo

compenetrado
sei tudo –
– sobre ela
a única coisa que oculta
é a sua origem
avó Maria apelido de solteira Balaban
Maria Calejada

nada diz
sobre o massacre
da Arménia –
o massacre dos Turcos

quer poupar-me
conceder-me vários anos de ilusão

sabe que chegará o dia
em que o descobrirei por mim mesmo
sem palavras maldições e lágrimas
a superfície
áspera
e a profundidade
da palavra

Zbigniew Herbert

POESIA QUASE TODA (1956-1998)
, Introdução de J. M. Coetzee, Selecção de J. M. Coetzee e Alissa Valles, Tradução do polaco e notas de Teresa Fernades Swiatkiewicz, Edição Cavalo de Ferro, Penguin Random House Grupo Editorial, Unipessoal, Lda., Lisboa, Outubro de 2024

[Vale a pena discutir]

Vale a pena discutir
por razões que a razão tece
com quem grita, manda vir
e a razão desconhece?

E travar-se de razões,
aumentar os decibéis
por meras opiniões
sobre dedos e anéis,

quem os mantém, quem os perde,
perdendo o pé e a razão
quando a disputa referve
e engrossa a discussão?


© Domingos da Mota

24.11.24

25 de Novembro

Quem celebre 
o 25 de Novembro 
contra Abril e exacerbe 

o instinto de vingança 
dá-nos mil razões para 
duvidar que defenda
 
a liberdade 
(que ousará sufocar 
e reprimir com vontade).


Domingos da Mota

9.11.24

Alto verbo-de-encher

Quando uma alta figura
se afigura lambe-botas
(e norteia a compostura
usual por linhas tortas)

afigura-se-me ser
um tartufo surreal,
um alto verbo-de-encher
sem coluna vertebral.


Domingos da Mota

2.11.24

Ponto final, parágrafo

A morte não bate à porta,
acomete, não avisa
e, sem mesuras, fatal,
dita o ponto final.

O parágrafo seguinte
serão outros a escrevê-lo,
com mais ou menos desvelo,
com mais ou menos requinte.


© Domingos da Mota

25.10.24

Epigrama cautelar

Cautela com os velhacos:
fracos com os fortes;
fortes com os fracos.

© Domingos da Mota

Uma Abelha na Chuva - 1971

21.10.24

Grandessíssimo

Se é rico
oh! riquíssimo esse grande
grandessíssimo!


© Domingos da Mota

10.10.24

vozes do dono

no coro 
de papagaios, comentadores 
avençados, sicofantas, cães 
de guarda, quantos serão
os jornalistas?

 Domingos da Mota

9.10.24

será gente

será gente
(diz-se crente)
esta gente
prepotente?

será gente
(mas que gente)
tanta gente
inclemente?

gente crente
ou descrente
fosse gente
simplesmente


Domingos da Mota









7.10.24

DE SÚBITO

Irrompem, de súbito,
relâmpagos e trovões –
tempestade seca.

© Domingos da Mota


in "Eufeme n.º 23, Magazine de Poesia (Abril/Junho 2023)", Editor e coordenador, Sérgio Ninguém

29.9.24

perder a face

se há quem passe
e quem repasse
palavras-passe
casas de passe

e isto dá-se
e aquilo faz-se
sem que se caia
se perca a face


© Domingos da Mota

27.7.24