31.10.23

a guerra é sempre horrenda

a guerra é sempre horrenda: 
até a guerra santa

Domingos da Mota

24.10.23

GAZA

Se isto
não é um
holocausto

[parafraseando Primo Levi]


Domingos da Mota 



28.9.23

Trinta

Qual a diferença...
entre um cego
e aquele que não quer ver.

Qassim Haddad

UM ÁRABE É UM ÁRABE, É UM ÁRABE, UM ÁRABE
, breve antologia de poesia árabe, textos introdutórios, Daniel Ferreira e Joana Santos, versões e traduções, André Simões e Joana Santos, 4.ª edição, contracapa, Vila Meã, Setembro de 2023:24

26.9.23

Epigrama cautelar

Quem escutar as notícias
munido de um par de antolhos,
pode emprenhar pelos ouvidos
e engravidar pelos olhos.


© Domingos da Mota

16.9.23

Este é um lugar onde...

Este é um lugar onde
a brusquidão da língua
faz crescer por vezes
flores hirsutas.


João Pedro Mésseder


O Porto Com Suas Palavras, Edições Plenilúnio, Coimbra, Março de 2023:20

25.8.23

Turismo de guerra

Foi às sortes nas trincheiras
para a banda dos Urais.
Outras foram as maneiras
com que evitou as trincheiras
das guerras coloniais.


Domingos da Mota

19.7.23

2.7.23

CÃO DE PAVLOV

Tanta sede de holofotes.
Tanta fome de palanque.

Tanto cão
de Pavlov.


Domingos da Mota

in Eufeme n. º 23 Magazine de Poesia (Abril/Junho 2022)

30.4.23

papagaios

palram os milhazes
grasnam os germanos
sempre loquazes
tão acacianos

e dos papagaios
que assim tagarelam
quantos são lacaios
ou peões de brega


© Domingos da Mota


13.3.23

Pecadilho

Mero atentado ao pudor,
segundo sua eminência,
sem razão para o clamor,
a celeuma, a estridência

que sobressalta o rebanho,
o que ora tuge e muge;
sendo um simples pecadilho
como sempre, como antanho,

por que razão há quem ruge
e amplifica o sarilho?
Ressarcir quem tenha sido
no seu templo violentado,

é um insulto parido,
pior que insulto, um pecado
capital.
Outrora, boas palavras

tratavam dessa ferida,
co'a promessa de alcançar
a vida 
depois da vida.


Domingos da Mota

11.3.23

Pena

Suspender é pena dura,
afastar, talvez um dia,
dize, com má catadura,
do topo da hierarquia.


Domingos da Mota

9.3.23

Do báculo e da mitra

Impassíveis quando isto
cheira a esturro, cheira mal,
continuam o dom bispo
e o velho cardeal.

Ambos ocultam diversos
dos que sob a sua alçada
são pedófilos perversos,
como se não fosse nada,

e recusam suspender,
por medida cautelar,
aqueles que, é bom de ver,
procuram dissimular.



Domingos da Mota

5.3.23

António Salvado (1936-2023)

Um fio de água


Um fio d'água foi o teu passar
tão fugidio que os meus olhos    presos
àquele movimento de surpresa
quase sem ver    mas vendo-te    ficaram.

Tua figura esguia meneava-se
como folhas vernais dum arvoredo
que uma brisa veloz tivesse aflado
subitamente para mais crescerem.

E assim cruzaste a minha solidão
sorrindo tão de leve que nem lembro
se para mim olhaste    em tal exílio.

Mas satisfez o que me deste    então:
que uma fonte escondida existe sempre
capaz de brotar água: seja um fio.


António Salvado

Um fio de água
, Antologia mínima I, Organização Nicolau Saião, Sirgo MMXII

7.2.23

AVARENTO

Cobiça
concupiscente a moeda

o metal com um sorriso
avarento infinitesimal


Domingos da Mota

Bolsa de Valores e Outros Poemas
, Temas Originais, Lda., Coimbra, 2010

7.1.23

TOCATA


Outra vez um nome:
rosto aceso, altivo,
com os olhos
pensativos, desfocados:

desvenda, abre sulcos
fatigados - de súbito
mais chão, rugoso, acídulo
Recorda, lembra

o mosto, o vinho,
o trigo, os dias
luminosos, demorados

(E os ossos a latir,
destemperados, laceram
o fulgor do lume vivo)


© Domingos da Mota

Bolsa de Valores e Outros Poemas, edição: Temas Originais, Lda., Coimbra, 2010